Conforme as evidências arqueológicas
encontradas nesse "sambaquí", que mais tarde seria abandonado pelo
esgotamento de recursos para sobrevivência, o grupo nômade dispunha de
tecnologia rudimentar e baseava-se numa economia de coleta, pesca e caça, onde
os moluscos representavam quase todo o resultado do esforço para fins de
alimentação e adorno. Há mais de 1.500 anos, os guerreiros indígenas tupinambás
começaram a conquista do litoral da região.
Os restos arqueológicos das aldeias
Tupinambás estudados na região de Cabo Frio (Três Vendas em Araruama e Base
Aero Naval em São Pedro da Aldeia) e também nos acampamentos de pesca (Praia
Grande no Arraial do Cabo) evidenciam uma adaptação ecológica mais eficaz que a
dos bandos nômades pioneiros. O profundo conhecimento biológico da paisagem
regional, em particular a Lagoa de Araruama e dos mares costeiros riquíssimos
em recursos naturais, fez com que o pescado se tornasse a base alimentar dos
tupinambás, reforçada pela captura de crustáceos, gastrópodes e moluscos.
A vegetação de restingas e mangues da
orla marítima ofereciam excepcionais possibilidades de coleta de recursos
silvestres, o que levou ainda a horticultura de várias espécies botânicas,
destacando-se a forte presença da mandioca no cardápio e ao domínio das
técnicas de cerâmica. A caça, atividade masculina exclusiva, era muito
importante como complemento de proteínas na dieta alimentar dos grupos locais.
Os índios tupinambás batizaram a
região de Cabo Frio como Gecay, único tempero da cozinha, feito com sal grosso
cristalizado. Nos terrenos onde viria se estabelecer a Município de Cabo Frio,
foram encontrados quatro possíveis sítios tupinambás. Os dois primeiros, o
Morro dos Índios e a Duna Boavista, apresentavam indícios de serem acampamentos
de pesca e coleta de moluscos, enquanto o terceiro, a Fonte do Itajuru, próxima
do morro de mesmo nome, era a única forma segura de abastecimento de água
potável e corrente disponível na restinga.
Na referida elevação junto a fonte, o
atual Morro da Guia, acha-se o sítio mais importante da região e um dos mais
relevantes do Brasil pré-histórico: o santuário da mitologia tupinambá, formado
pelo complexo de pedras sagradas do Itajuru ("bocas de pedra" em
tupi-guarani). Sobre estes blocos de granito preto e granulação finíssima, com
sulcos e pequenas depressões circulares, os índios contavam histórias do seus
heróis feiticeiros que ensinavam as artes de viver e amar a vida. Quando estes
heróis civilizadores morriam, transformavam-se em estrelas, até que o sol
decidisse enviá-los ao itajuru, sob forma de pedras sagradas, para serem
veneradas pela humanidade. Caso fossem quebradas ou roubadas, todos os índios
desapareciam da face da terra.
Em 1503, a terceira expedição naval
portuguesa para reconhecimento do litoral brasileiro, sofreu um naufrágio em
Fernando de Noronha e a frota remanescente se dispersou. Dois navios, sob o
comando de Américo Vespúcio, seguiram viagem até a Bahia e depois até Cabo
Frio. Junto ao porto da barra de Araruama, os expedicionários construíram e
guarneceram com 24 "cristãos" uma fortaleza feitoria para explorar o
pau-brasil, abundante na margem continental da lagoa.
Em 1512, este estabelecimento comercial-militar
pioneiro, que efetivou a posse portuguesa da "nova terra descoberta"
e deu início a conquista no continente americano, e que foi destruído pelos
índios tupinambás em função das "muitas desordens e desavenças que entre
eles houve" em 1526. Os franceses traficavam pau-brasil e outras
mercadorias com os índios, na costa brasileira, desde 1504. Durante as três
primeiras décadas do século XVI, praticamente restringiram sua atuação ao
litoral da região nordeste.
A partir de 1540, por causa do rigoroso
policiamento naval português nestes mares, os franceses exploraram o litoral e
levantaram os recursos naturais de Cabo Frio. Em 1556, construíram uma
fortaleza-feitoria para exploração de pau-brasil, na mesma ilhota utilizada
anteriormente pelos portugueses, junto ao porto da barra de Araruama. A
"Maison de Pierre" cabofriense ampliou e consolidou o domínio francês
no litoral sudeste, iniciado com o Forte Coligny no Rio de Janeiro, um ano
antes.